Inclusão

1) DICAS DE ENSINO PARA CRIANÇAS E ADULTOS COM AUTISMO:
Autora: Temple Grandin – PhD.
*traduzido por Kathia (Delegada Regional e funcionária da APAE (Betim-MG)

Bons professores me ajudaram a atingir o sucesso. Eu estava pronta para superar o autismo porque tive bons professores.

Na idade de dois anos e meio, fui colocada num berçário estruturado com professores experientes.

Desde a idade de muito cedo, fui ensinada a ter boas maneiras e a me comportar à mesa do jantar.

Crianças com autismo precisam ter o dia estruturado e professores que saibam ser firmes, mas humanos.

1 - Muitas pessoas com autismo são pensadores visuais. Eu penso por imagens. Não penso por linguagem. Todos os meus pensamentos são como video-tapes correndo em minha imaginação. Imagens são minha primeira linguagem.

Os substantivos foram as palavras mais fáceis de aprender, porque eu podia formar uma imagem em minha mente .

Para aprender palavras como "embaixo" e "em cima", o professor podia mostrá-las para a criança. Por exemplo: Pegava o avião de brinquedo e dizia: "em cima", enquanto fazia o avião levantar da cadeira.

2 - Deve-se evitar séries de instruções verbais longas. Pessoas com autismo têm problemas de lembrar seqüências. Se a criança sabe ler, escreva as instruções no papel. Sou inábil em lembrar seqüências. Se pergunto a localização de um posto de gasolina, posso lembrar apenas três passos. Localização com mais de três instruções têm que ser escritas. Ainda tenho dificuldade de lembrar números de telefones, porque não posso formar uma imagem em minha mente.

3 - Muitas crianças com autismo são bons desenhistas, artistas e programadores de computador. Estes tipos de talento poderiam ser encorajados. Acho que há necessidade de dar mais ênfase no desenvolvimento dos talentos das crianças.

4 - Muitas crianças autistas tem fixação em um assunto, como trens ou mapas. A melhor forma de trabalhar com essas fixações é usá-las como motivos de trabalhos escolares. Ex.: se uma criança gosta de trens, então use trens para ensiná-la a ler e fazer cálculos. Leia um livro sobre trens e faça problemas matemáticos com trens. Por exemplo: Calcule a distância que um trem percorre para ir de Nova York a Washington.

5 - Use métodos visuais concretos para ensinar números e conceitos. Meus pais me deram um brinquedo matemático que me ajudou a aprender números. Ele consistia em um jogo de blocos que tinha comprimentos diferentes e cores diferentes para os números de um a dez. Com isto, aprendi a adicionar e subtrair. Para aprender frações, meu professor tinha uma maçã de madeira cortada em quatro partes e uma pêra cortada ao meio. A partir dai, aprendi o conceito de quatro e metades.

6 - Eu tinha a pior letra da minha classe. Muitas crianças autistas têm problemas com controle motor de suas mãos. Letra bonita é algumas vezes muito difícil. Isto pode frustrar totalmente a criança. Para reduzir a frustração e ajudar a criança a adquirir escrita, deixe-a digitar no computador. Datilografar é, as vezes, muito mais fácil.

7 - Algumas crianças autistas aprenderão a ler mais facilmente por métodos fônicos, e outras aprenderão com a memorização das palavras. Aprendi pelo método fônico.

8 - Quando era criança, sons altos como o da campainha da escola, feriam os meus ouvidos como uma broca de dentista fere um nervo. Crianças com autismo precisam ser protegidas de sons que lhes ferem os ouvidos. Os sons que me causaram os maiores problemas são: campainhas de escola, zumbidos no quadro de pontuação dos ginásios, som de cadeiras se arrastando pelo chão. Em muitos casos a criança estará pronta para tolerar o sino ou zumbido se ele for abafado simplesmente pelo recheio de um tecido, papel ou um tipo de cadarço ou cordão. O arrastar de cadeiras pode ser silenciado com colocação de borrachas de tênis ou carpetes. A criança pode temer uma determinada sala, porque tem medo que de repente possa ser submetida ao agudo do microfone vindo do sistema amplificador. O medo de um som horrível pode causar péssimo comportamento.

9 - Algumas pessoas autistas são importunadas por distrações visuais ou luzes fluorescentes. Elas podem ver a pulsação do ciclo 60 Hz de eletricidade. Para evitar este problema, coloque a carteira da criança perto da janela ou tente evitar usar luzes fluorescentes. Se as luzes não podem ser evitadas, use as lâmpadas mais novas que você puder conseguir. Lâmpadas mais novas tremem menos.

10 - Algumas crianças autistas hiperativas que atormentam todo o tempo, serão por vezes acalmadas se forem vestidas com um colete com enchimento. A pressão da roupa ajuda a acalmar o sistema nervoso. Eu fui grandemente acalmada por pressão. Para melhores resultados, a roupa poderia ser vestida por vinte minutos e então retirada por alguns minutos. Isto previne o sistema nervoso de se adaptar a ela.

“Ensinar” a criança a ser abraçada pode ser uma alternativa – e abraçá-la com suavidade, de forma a que ela não se sinta sufocada. (nota de Argemiro).

11 - Algumas pessoas com autismo em particular, responderão melhor e terão melhorado o contato visual e a fala se o professor interagir com elas enquanto estiverem nadando ou rolando em uma esteira. A introdução sensória pelo balanço ou a pressão de esteira algumas vezes ajuda a melhorar a fala. O balanço pode ser feito como um jogo divertido. Ele NUNCA deve ser forçado.

12 - Algumas crianças e adultos podem cantar melhor que falar. Podem responder melhor se as palavras forem cantadas para eles. Algumas crianças com extrema sensibilidade sonora responderão melhor se o professor falar com elas em um leve sussurro.

13 - Algumas crianças e adultos não-verbais podem não processar estímulos visuais e auditivos ao mesmo tempo. Elas são monocanais, não podem ver ou ouvir ao mesmo tempo, e não podem ser chamadas a ver e ouvir ao mesmo tempo. A elas poderá ser dada ou uma tarefa auditiva ou uma tarefa visual. Seu sistema nervoso imaturo não está apto a processar simultaneamente estímulos visuais e auditivos.

14 - Em crianças não-verbais mais velhas e adultos, o tato é algumas vezes seu senso mais confiável. Às vezes é muito mais fácil para elas sentir. Letras podem ser ensinadas ao deixá-las tatear letras plásticas.

Elas podem aprender seu itinerário (rotina) diário, sentindo objetos alguns minutos antes da atividade programada. Por exemplo: 15 minutos antes do almoço, dê a elas uma colher para segurar. Alguns minutos antes de sair de carro, deixe-a pegar um carrinho de brinquedo.


2) MANUAL CONFECCIONADO POR FAUSTA CRISTINA REIS, MÃE DE MILENA E AUTORA DO BLOG MUNDODAMI.COM, PARA A PROFESSORA QUE RECEBERÁ SUA FILHA NA ESCOLA:

Olá Prof. Grazi

Você está recebendo este ano em sua turma uma aluna muito especial (embora todos sejam) que é a Milena. Pretendo te apresentar algumas informações a respeito dela para que você a conheça melhor.

Um breve resumo de nossa história: Milena tem um casal de irmãos, Tatá tem 19 (a irmã querida) e Paulo Victor 23 anos são meus filhos de outro casamento, sendo ela a única filha natural do papai Gilberto. Queríamos muito um filho e após seis anos de casados achamos que já poderíamos realizar nosso sonho com a mamãe podendo parar de trabalhar e ficar em casa por dois anos aproximadamente em dedicação exclusiva ao bebê. Quando nasceu, após uma gravidez deliciosa e um parto muito tranquilo, Milena se mostrou quietinha demais e com um olhar muito diferente, sendo que já aos três meses de idade despertou a minha atenção de mãe experiente, pedagoga e irmã mais velha, acostumada em ver bebês se desenvolvendo bem. Após insistentes conversas com os médicos tivemos a confirmação de que havia um atraso no seu desenvolvimento o que mais tarde se definiu como sendo um Transtorno Invasivo do Desenvolvimento (TID).

Os Transtornos Invasivos do Desenvolvimento são um conjunto de desordens que atualmente agrupam outras síndromes como a Síndrome de Rett e o Transtorno Desintegrativo da Infância, mas engloba também um outro sub grupo de desordens chamado Transtornos do Espectro do Autismo, que agrupa o Autismo Clássico, a Síndrome de Asperger, o Autismo Atípico que pode ser chamado também de Transtorno Invasivo do Desenvolvimento Sem Outra Especificação (TID-SOE). Os graus mais leves de comprometimento são os mais comuns.

Esquematizando esses conceitos, ficaria assim:

Apesar de ser um grupo com características em comum, cada pessoa com autismo é única, pois cada um manifesta os sintomas de forma diferente. O mais importante é saber que antes de enxergarmos o autismo temos que ver a pessoa na sua individualidade. Temos então, crianças tímidas e com autismo, teimosas e com autismo, calmas ou agitadas apesar do autismo. Definir o que é autismo e o que é da própria pessoa é difícil, mas não é necessário, se tratarmos a criança como tratamos as outras, principalmente se as tratamos com carinho. Qualquer preconceito, medo, insegurança são percebidos por eles, não tenha dúvida. Por isso, não hesite em nos procurar, estamos à sua total disposição.
A pessoa com autismo tem muita dificuldade em aceitar limites, pois eles não entendem bem a lógica do outro e se tem vontade de fazer algo, não entende porque precisa abrir mão disso, isso não significa que a gente não deva impor limites, mas a maneira de fazermos isso muda um pouco. Podemos direcionar para o certo e não dizer de forma impositiva: não. Por exemplo, ao invés de dizer: "não suba na mesa" podemos dizer: "a mesa é para estudar", ao invés de "assim não pode", é possível sinalizar: "é assim que se faz" e os exemplos se multiplicam:

L : "Não pode pegar o estojo da colega" – J : "O seu estojo é este, cada um fica com o seu".

L : "Não pode levantar agora" – J : "Daqui a pouco quando você terminar este desenho você vai poder levantar".

L : "Não pode gritar" –J: "O que você quer? Vamos conversar, falar é melhor que gritar".

L : Ao invés de dizer "não te empresto", pode dizer J :"agora estou usando", "preciso usar mais tarde", "quando puder te empresto um pouquinho".

A respeito desta nova forma de estabelecer limites, devo dizer que não é muito fácil, pois nossa cultura e educação são baseadas no não pode, não faça e será preciso perseverança pois não se muda da noite para o dia. Mas é muito bom quando mudamos este jeito de lidar com as crianças, pois elas ficam muito mais tranqüilas com esta abordagem. Com o tempo nós vamos percebendo o quanto é melhor agir assim.

Quando estivermos diante de uma conduta inadequada precisamos então dizer com firmeza: é assim que fazemos e imediatamente redirecionar a atenção. Quando uma atitude inadequada acontece, como gritar ou se bater, como jogar objetos ou subir na mesa é porque esta criança quer muito chamar a atenção, comunicar que está frustrada, cansada ou irritada com algo e se ela conseguir reforço para sua intenção: chamar a atenção – ela vai repetir este comportamento outras vezes.

É assim que conseguimos manejar muitas condutas inadequadas de nossa Milena, se em casa ela grita, nós nunca dizemos não grite, passo a dar atenção a ela e convido para brincar ou cantar e só quando estamos nos divertindo, falo que o grito faz doer o ouvido da mamãe e que toda menina que é bonita não grita, conversa. É claro que em alguns momentos o não é inevitável, então falamos o não e já direcionamos a atenção para outra coisa. Se ela quer, por exemplo, brincar com a tesoura de ponta, eu pego a tesoura calmamente, falo que a tesoura dela é outra que não machuca e que vou pegar depois e na mesma hora chamo para ir a outro lugar e fazer outra coisa.

Na escola os comportamentos inadequados mais comuns são os gestos repentinos de agressividade como puxar o cabelo ou dar uma palmada no colega. Apesar de raros, são comportamentos que expressam uma irritação com algo que aconteceu e ela fica muito arrependida, pede desculpas, mas ao perceber que errou ela fica ainda mais irritada, pois não consegue lidar com a sensação de não poder voltar atrás. É melhor neste momento não a obrigar a pedir desculpas ou chamar a atenção pelo erro. Deixar o pedido de desculpas para depois e chamá-la para conversar, sair da sala, se distanciar do colega e depois que a irritação tiver passado, aí sim, cobrar o pedido de desculpas, explicar que não se bate nas pessoas, etc. Qualquer ocasião em que eles erram, é melhor apenas dizer rapidamente que está errado e deixar para chamar a atenção depois, uma vez que ela tem exata noção de que cometeu um erro e este é um dos piores momentos para tentar ensinar algo a ela.

Milena adora perguntar, são suas intermináveis perguntas que podem atrapalhar o andamento da aula, nesta hora seria bom que ela tivesse orientações claras como: eu já te respondi isto, agora eu quero que você se sente em sua carteira, primeiro faça esta atividade, depois vamos fazer tal coisa, depois vamos sair para o lanche, etc. Quando possível, devemos dar a ela uma sequência das atividades e acontecimentos pois isso diminui a ansiedade. Sempre que houver um acontecimento extra na escola, como um teatro, uma visita ou algo que irá alterar a rotina, ou mesmo uma decoração de algum dos ambientes para eventos, seria bom antecipar para Milena, as surpresas fazem que ela fique agitada sem entender o que está acontecendo e por que. Ela reage diferentemente às mudanças, mas sempre fica muito estressada, embora possa manifestar sua estranheza apenas algumas horas depois.

A sensibilidade sensorial das pessoas com Transtorno do Espectro do Autismo pode variar de hiper para a hipo, ou seja, ela pode ser hipersensível a toques ou barulhos e pode ser hipo sensível à dor como é o caso da Milena. Ela não gosta muito de abraços a não ser quando a iniciativa é dela e isso acontece quando menos esperamos. Ela ouve barulhos que não ouvimos (uma moto acelerando na rua ou um bebê chorando ao longe) e se assusta com barulhos repentinos (fogos, objetos caindo) e se irrita com barulhos de motores (furadeiras, etc). Nestes momentos explicar o que é o barulho e dizer que vai passar ajuda muito e quanto aos abraços, ela está acostumada a recebê-los e o único senão é que ela vai ficar meio encolhida e pode ficar irritada com abraços insistentes e apertados que às vezes as outras crianças insistem em dar.

A pessoa com autismo reage negativamente frente às frustrações. Embora já consiga administrar melhor suas reações, Milena ainda sente muito quando não consegue o que quer. Se ela cisma com um objeto por exemplo, esta cisma pode virar uma verdadeira obsessão e neste momento receber um não seria o gatilho para detonar uma crise. O melhor, como já foi dito seria contornar para algo como: pode sim, mas em outro momento. Como nem sempre é possível em um momento de crise Milena pode tentar jogar algo no chão, fritar ou até mesmo bater em alguém para expressar sua raiva. O melhor é desviar sua atenção neste momento, se possível tirando-a do ambiente por alguns minutos.

Ao longo do ano vamos conversando sempre que for necessário, eu sou totalmente aberta para conversar sobre o autismo, sobre minha filha, situações e posturas. Pode estar certa que irei compreender quando você não souber como agir e jamais irei julgá-la por sua forma de preceder em sala.

Pode parecer muita coisa, mas até hoje todas as professoras de Milena se apaixonaram por ela.

Um ótimo trabalho para você e que tenhamos um ano produtivo e prazeroso! Com carinho,

Fausta Cristina de Pádua Reis
Pedagoga, Psicopedagoga, mãe de Milena, Thamires e Paulo Victor