06/05/2019

A proteção jurídica da pessoa com Autismo

Em nossa Reunião de Pais, Familiares e Colaboradores de abril de 2019, estiveram presentes as advogadas integrantes da Comissão dos Direitos da Pessoa com Deficiência do Instituto Brasileiro de Direito da Família (IBDFAM/RS), Andressa Tonetto Fontana (andressatf.adv@gmail.com), Bruna Katz (contato@brunakatz.com.br) e Raquel Tedesco (contato@raqueltedesco.com.br).

A palestra gratuita na AMRIGS tratou sobre diferentes questões - educação, mobilidade, saúde, autonomia - relacionadas à proteção jurídica da infância à vida adulta da pessoa com Autismo. Bruna Katz e Raquel Tedesco também foram nossas palestrantes convidadas em dezembro de 2017.


Foto: Paula Moizes
Educação

Em vigência desde janeiro de 2016, o Estatuto da Pessoa com Deficiência (PcD) reafirma garantias de acesso à educação previstas desde a Constituição Federal de 1988.

Também conhecido por Lei Brasileira de Inclusão (Lei nº 13.146/2015), o Estatuto assegura a matrícula da pessoa com Autismo em qualquer escola pública ou privada. Além disso, a LBI também garante a presença de um monitor em sala de aula, sem nenhum custo, que auxilie nas questões de interação e integração do aluno com Autismo com os demais colegas de turma.

Tedesco lembra que, segundo LBI, é crime punível com multa e reclusão de dois a cinco anos recusar ou dificultar a matrícula de um aluno em razão do Autismo, e isso vale para qualquer instituição de ensino, seja ela pública ou privada. A Lei Berenice Piana (Lei nº 12.764/2012), que institui a Política de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro do Autismo (TEA), ainda acrescenta que o gestor escolar que recusar a matrícula será punido de multa e, em caso de reincidência, haverá perda do cargo.

Apesar do acesso ao ensino estar garantido por lei à pessoa com Autismo desde 1988, grande parte das instituições públicas e privadas mantêm obstáculos que as impedem de estarem preparadas para atender as necessidades específicas de seus alunos e alunas. No caminho para uma Educação Inclusiva, há escolas que ainda recusam matrícula para pessoas com Autismo.

Seja quais sejam as justificativas, a família do aluno está no seu direito de registrar um Boletim de Ocorrência (B.O.) na delegacia mais próxima, tendo em vista que a recusa de matrícula em razão da qualquer deficiência é configurada como crime por lei. Além disso, deve-se entrar com uma ação judicial no Ministério Público por meio da Defensoria Pública ou advogado/a particular.

Foto: Paula Moizes
Mobilidade

Algumas questões ligadas à mobilidade urbana das pessoas com Autismo foram debatidas durante a palestra, como o direito às vagas de estacionamento para pessoas com deficiência, isenção de impostos na compra de veículo novo e desconto/isenção na passagem área para acompanhante de PcD.

O Cartão DeFis para vagas prioritárias de estacionamento é o documento de porte obrigatório para identificação de um veículo que quiser utilizar uma vaga preferencial e estiver sendo utilizado por ou para o transporte de uma pessoa com Autismo. A validade do Cartão DeFis varia de município para município, mas assim que feito ele pode ser usado em todo o território nacional. O site da FADERS Acessibilidade e Inclusão indica os locais onde solicitar o Cartão DeFis no Rio Grande do Sul.

Não existe uma renda familiar máxima para ter o direito do desconto na passagem área de, no mínimo, 80% para o acompanhante da pessoa com Autismo - em caso de exigência do mesmo. Para adquirir esse desconto/isenção, antes de comprar as passagens, indica-se entrar em contato com a companhia área, que deverá encaminhar à família o formulário conhecido como MEDIF.

Cada empresa área tem o seu MEDIF, por isso consulte a companhia do voo que você deseja antes de comprar a passagem. Assim que este documento estiver preenchido, envie-o para o e-mail indicado pela empresa e ligue novamente informando sobre o envio do mesmo e solicitando as próximas orientações para obter o desconto. Caso o desconto/isenção não seja cedido, é possível fazer uma denúncia à Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), que tem garantido este direito às famílias.

Bruna Katz. Foto: Paula Moizes
A isenção de IPI (imposto federal), ICMS e IPVA (impostos estaduais) vale para a compra de veículos novos, de fabricação nacional e de até R$ 70 mil. Este veículo deverá ser registrado em nome da pessoa com deficiência e poderá ser conduzido por três pessoas autorizadas (mesmo que nenhuma delas seja a pessoa com TEA). A isenção é concedida para proporcionar uma melhor mobilidade da pessoa com Autismo.

Atualmente, a grande maioria das concessionárias têm um serviço de despachante que irá auxiliar a família, sem custos adicionais, no processo para isenção de impostos. Com o Laudo de Avaliação em mãos, Katz ressalta que é possível adquirir a isenção de 3 a 5 dias, em alguns casos. Lembrando que este Laudo deve estar assinado por médicos que estejam credenciados no Sistema Único de Saúde (SUS).

As redes de saúde municipais têm se organizado de formas diferentes para a obtenção dessas assinaturas. Por isso, não há um caminho certo, para cada família o processo pode ser diferente, algumas tendo mais facilidade que outras.

Foto: Paula Moizes
Saúde

De acordo com o próprio Superior Tribunal de Justiça, as negativas de tratamentos e restrições contratuais dos planos de saúde são abusivas. Uma das principais justificativas utilizadas pelos planos é que as terapias para pessoas com Autismo não estão previstas no contrato ou no Rol da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS).

De acordo com Katz, a Justiça tem julgado a favor das famílias nestes casos, por entender que é o(a) médico(a) quem deve indicar as terapias/tratamentos que deverão ser cobertos pelo plano de saúde.

Os planos de saúde podem tentar limitar as sessões de cada terapia, o que também pode ser levado ao judiciário, visto que um tratamento incompleto poderá não ser tão eficiente como deveria. No caso de não haver um profissional de determinado tratamento que atenda pelo plano de saúde, este deverá oferecer à pessoa com Autismo um profissional fora da rede do plano.

Para terapias e tratamentos alternativos, como o uso de medicamentos não aprovados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), o requerente deverá reunir literatura médica sobre o assunto para fundamentar o processo. Deve-ser comprovar que os medicamentos presentes na lista não são efetivos, que o medicamento solicitado é imprescindível para o tratamento da pessoa com Autismo e que a família não dispõe de renda para adquirir o mesmo.

Andressa Fontana. Foto: Paula Moizes
Curatela e Tomada de Decisão Apoiada

Marco na garantia da autonomia do indivíduo com Autismo, a legislação relativa à Curatela e à Tomada de Decisão Apoiada foi instituída pelo Estatuto da PcD em 2015. Ela altera o texto do Código Civil (2012) que diz respeito à Interdição de pessoas com deficiência intelectual, uma vez que a Lei Brasileira de Inclusão não reconhece a incapacidade absoluta da pessoa com deficiência.

Pelo contrário, o texto atual considera que a deficiência não afeta a plena capacidade civil da pessoa. A deficiência pode reduzir a capacidade de discernimento da pessoa e, logo, ela precisará de auxílio maior para exercer certos atos da vida civil.

No caso da Curatela, caberá ao Juiz e a uma equipe interdisciplinar determinar quais são esses atos civis que poderá exercer a pessoa com Autismo, que deverá ser ouvida durante todo esse processo.

Bruna Katz, Raquel Tedesco e Andressa Fontana. Foto: Paula Moizes
A Tomada de Decisão Apoiada é um processo que pode ser aberto pela própria pessoa com deficiência junto a um advogado, ou na Defensoria Pública do Estado. Neste caso, são eleitos dois apoiadores para atos da vida civil. A Curatela também poderá ser compartilhada. A nova legislação busca, assim, promover a autonomia da pessoa com Autismo e, consequentemente, de sua família.

É indicado que as famílias busquem a Curatela total ou parcial, dependendo do caso, de seus/suas filhos/as com Autismo quando estes/as completarem 18 anos, considerando as obrigações legais como, por exemplo, votar e prestar serviço no Exército (obrigatoriedade somente para os homens). Se a pessoa com TEA demonstrar interesse e consciência para exercer esses atos, o processo poderá ser revisto a qualquer momento - tanto no caso da Curatela quanto da Tomada de Decisão Apoiada.

Fontana ressalta que cada caso é um caso e nem sempre a Curatela total é necessária. Por exemplo, há pessoas com TEA que não sabem lidar com questões patrimoniais, porém tem completa noção da situação política do Brasil, e vice-versa.

Equipe de sócio-voluntários do Autismo & Vida com as palestrantes. Foto: Paula Moizes
Logo após o final da palestra, demos início a mais uma edição do nosso Projeto Abraço (foto abaixo), um espaço aberto de acolhimento e troca de experiências entre familiares de pessoas com Autismo.

O Autismo & Vida é uma Associação sem fins econômicos e um dos nossos princípios institucionais é o pluralismo de ideias e pensamentos, o que nos coloca abertos a diversidade de conteúdos em nossas palestras realizadas por diferentes profissionais. No entanto, o que for proferido em cada evento é de inteira responsabilidade do palestrante e não necessariamente retrata o posicionamento do IA&V.

Para saber mais sobre outras leis que abrangem as pessoas com Autismo, consulte a aba "Legislação" do nosso site. A próxima Reunião de Pais, Familiares e Colaboradores na AMRIGS será no dia 18 de maio.

Projeto Abraço: espaço de acolhimento entre familiares. Foto: Paula Moizes

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